Recordando a poetisa AUTA DE SOUZA


          
Fonte:Verbete organizado
Constância Lima Duarte e Diva Cunha
Auta de Souza

Vida:
Nasceu em Macaíba (RN), em 12 de setembro de 1876, filha de Eloy Castriciano de Souza e Henriqueta Leopoldina de Souza e irmã de dois políticos e intelectuais, Henrique Castriciano e Eloy de Souza. Aos 14 anos apareceram os primeiros sinais da tuberculose, obrigando-a a abandonar os estudos e a iniciar uma longa viagem pelo interior em busca de cura.
Auta de Souza deve ser considerada a poetisa norte-rio-grandense que mais ficou conhecida fora do Estado. Sua poesia, de um romantismo ultrapassado e com leves traços simbolistas, circulou nas rodas literárias do país despertando sempre muita emoção e interesse, e foi fartamente incluída nas antologias e manuais de poesia das primeiras décadas. Como a maioria dos escritos femininos, sua obra poética deixou-se contaminar pelas experiências vividas, o que, aliás, não compromete o lirismo e o valor estético de seus versos.
Aos 24 anos, no dia 7 de fevereiro de 1901, Auta de Souza morria tuberculosa. No ano anterior havia publicado seu único livro de poemas sob o título de Horto, com prefácio de Olavo Bilac, que obteve significativa repercussão na crítica nacional. Em 1910 saía a segunda edição, em Paris, e, em 1936, a terceira, no Rio de janeiro, com prefácio de Alceu de Amoroso Lima.
Antes de serem reunidos em O Horto, parte de seus poemas foram publicados em jornais como A Gazetinha, de Recife, O Paiz, do Rio de Janeiro, e A República, A Tribuna, o Oito de Setembro, de Natal, e nas revistas Oásis e Revista do Rio Grande do Norte. Os poucos poemas inéditos que deixou foram recolhidos e publicados nas edições seguintes de o Horto.

Caminho do Sertão
A meu irmão João Câncio
Tão longe a casa! Nem sequer alcanço
Vê-la através da mata. Nos caminhos
A sombra desce; e, sem achar descanso,
Vamos nós dois, meu pobre irmão, sozinhos!
É noite já. Como em feliz remanso,
Dormem as aves nos pequenos ninhos ...
Vamos mais devagar ... de manso e manso,
Para não assustar os passarinhos.
Brilham estrelas. Todo o céu parece
Rezar de joelhos a chorosa prece
Que a noite ensina ao desespero e à dor ...
Ao longe, a Lua vem dourando a treva ...
Turíbulo imenso para Deus eleva
O incenso agreste da jurema em flor.
Melancolia
Sinto no peito o coração bater
Com tanta força que me causa medo ...
Será a Morte, meu Deus? Mas é tão cedo!
Deixai-me inda viver.
Tudo sorri por este campo em flor
O Amor e a Luz vão pelo Céu boiando ...
Só eu vagueio a suspirar, chorando
Sem Luz e sem Amor.
Lutando sempre com uma dor cruel
Cheia de tédio e desespero, às vezes;
Minh’alma já tragou até as fezes
O cálice de fel.
...............................................
E o coração no seio a palpitar,
Como se acaso não tivesse crença,
Pulsa com a força indefinida, imensa
Dos vagalhões do Mar.
Ao meu bom Anjo
Dizem que a vida não é mais que um sonho,
Meu Deus, quero sonhar!
Empresta-me, anjo bom, as tuas asas,
Guarda no seio a minha fronte em brasas,
Ensina-me a rezar!
Vamos, vamos, além ... foge comigo!
Procuremos bem longe um doce abrigo,
Na pátria dos arcanjos ...
A vida é sonho e como um sonho passa ...
Pois bem! vamos viver no Céu da graça,
Meu Deus! como dois anjos!
Quero fugir do mundo tenebroso,
Labirinto de dores ...
Mensageiro divino, vem comigo,
Quero sonhar, viver, sorrir contigo,
No Éden há só flores!
Minha alma, casta rola abandonada,
Desfalece sozinha pela estrada,
Não pode mais voar ...
Empresta-lhe anjo bom, as tuas asas:
Sinto estalar-me o coração em brasas,
Cansado de chorar.
Assim voando pelo espaço em fora
E vendo-te a meu lado a toda hora,
Quero — fugindo deste mundo agreste,
Unida ao seio teu,
Embalada por ti, anjo celeste! —

Buscar meu ninho pelo azul do Céu!

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