CARTA À MINHA PSIQUIATRA: desabafo (maio/2016)
Prezada e
estimada psiquiatra, hoje, domingo, o5 de maio de 2016, faz, exatamente, 5 anos
que fui internada pela primeira vez (só foram duas internações, graças ao meu
Deus). Lembro-me, que há cinco anos, eu estava “sozinha” na Casa de Saúde Sta.
Maria. Digo “sozinha”, porque quando se está em crise, mesmo que a pessoa
esteja arrodeada por outros pacientes, cada qual fala a sua própria linguagem:
são mundos diferentes! Naquele dia de domingo, recordo que
me perguntaram se eu queria ver o meu esposo, disse que não. Eu estava meio
lúcida, e tinha certeza absoluta, de que não o queria ver; sabia o quanto ele
estava sofrendo! Era uma situação inusitada para nós dois, ou melhor dizendo: nós
quatro: eu, ele e nossos 2 filhos. Entretanto, fazia-se necessário ficar
distante dele, pois eu precisava analisar “como havia chegado a tal ponto?” Recordo
também, que tive a oportunidade de saber como fora aquele bendito dia das mães
para as três pessoas mais importantes da minha vida: meu esposo e filhos ( uma
moça, na época com 24 anos e um rapaz com 22): tinha sido um almoço silencioso
e triste. E enquanto, eu ouvia o relato daquela situação, meu coração se
contraia de dor e meu espírito se quebrantava; fiquei muito, muito triste
mesmo! Era como se o mundo tivesse se acabado, como se a minha família tivesse
morrido e pior, como se eu fosse a única responsável por tanta tristeza. Pôs-me
no lugar de cada um deles e imaginava a dor que sentiam: foi horrível descobrir
o quanto eles estavam sofrendo, afinal era o primeiro dia das mães, que
passavam sozinhos e sei, que aquele almoço, certamente, foi o pior da vida
deles. Contudo, eles não sabiam que o meu espírito, meu ser estava sentado
junto deles, pois eu sentia tanta falta deles, que o meu âmago chorava, mas eu
não conseguia “GRITAR AO MUNDO A MINHA DOR”, SÓ CONSEGUIA PENSAR, PENSAR E
PENSAR: “Por que, meu Deus, caíra numa situação tão delicada? O que eu fizera?
Onde errara?” Também, fiquei imaginando o sofrimento do meu querido esposo, ao
receber o recado, pela enfermeira, que eu não o queria ver. Imaginei seu
semblante desolado, seus pensamentos confusos e podia ver a tristeza em seu
rosto, mesmo sem estar perto dele. Conheço meu esposo e sei, que quando ele
está muito triste, então, se “tranca” totalmente e, transforma-se numa espécie
de “pedra-viva”, não deixando transparecer suas emoções: mas, de mim, ele não
conseguiria esconder e eu, ainda não me sentia “pronta” para olhar nos seus
belos olhos claros e sentir que sim, eu o amava muito e que, sentia tanto
quanto ele, por aquela situação tão inusitada em nossas vidas. Eu o amo muito e
naquela época, há exatos 5 anos atrás, eu também já amava tanto ou mais do que
o amo hoje.
Foram dias
horríveis naquele sanatório. Explico: quando fui me sentindo melhor, as
primeiras interrogações que me fiz, foram: “E agora, como encarar minha
família? Como ganhar de volta o respeito e confiança que eles tinham em mim? E o meu trabalho? Como agir na Empresa?
Será que de hoje em diante, tudo o que eu disser, eles (meus colegas e meus
superiores) irão considerar “besteiras” ou “loucuras”?” Isso me matava aos
pouquinhos, porque sentia que estava consciente o bastante para me analisar,
contudo jamais serei a mesma pessoa para a sociedade, devido o preconceito que
há quanto à questão das crises nervosas ou simplesmente, momentos de loucura
(quem não os tem, teve ou terá um dia...), de insanidade mental. Recordei,
também que começara a escrever um prefácio para o livro, a estória da vida da
minha irmã mais nova, a qual é esquizofrênica e que, a dificuldade maior que enfrentei
foi me interrogar: “Como passar para o leitor, em palavras, a sensação que ela
sentia ao ser internada, se eu nunca passei por uma situação dessa?” Foi aí,
que a “ficha” começou a cair. E quando saí da clínica, peguei um papel e refiz
o meu prefácio (não, antes de ter o cuidado de pesquisar na internet conceitos,
definições, opiniões diversas sobre a origem das doenças mentais,
principalmente, a esquizofrenia e também, comprei diversos livros sobre o
assunto), porque agora sim, tinha respaldo, autoridade para tratar do assunto,
talvez até mais do que determinados psiquiatras que jamais passaram pela
situação que eu passei. Podia relatar de forma clara, lúcida e fiel o que se passa
na cabeça, na mente de alguém ao ser internada. Infelizmente, minha querida “mana”
tem tantas crises, que numa dessas, perdeu esse prefácio. Só faltei chorar,
pois toda referência bibliográfica estava no prefácio para ser posto depois na
obra. Além disso, ela esqueceu aonde guardou a estória da sua vida, a qual eu
já tinha lido e procedido à Revisão ortográfica e cujos relatos eram digamos,
no mínimo “espetaculares”; amei a forma simples e clara como ela descreveu
algumas das crises, embora que, no decorrer dos relatos, podia-se perceber
certos “vácuos”, que podiam ser interpretados como pontos obscuros dos relatos.
Agora, não adiante me lamentar, apesar de sentir, que aqueles relatos, poderiam
se transformar em ótima fonte de pesquisa, no futuro.
Voltemos à
Clínica: o primeiro absurdo que ocorreu comigo, naquele manicômio foi o fato de
eu pagar um Plano de Saúde tipo Apartamento e quando da minha primeira
internação fui posta na Enfermaria; ou seja, não dormi nada nem descansei
absolutamente nem um minuto, depois que o efeito dos remédios começou a
desaparecer, porque as outras pacientes fumavam e gritavam o tempo todo e eu,
“morrendo” de medo de ser “queimada” acidentalmente, por alguma delas. Há, o
cigarro era fornecido pelas próprias enfermeiras. Mas, o que me chateou mesmo,
foi o fato de pagar caro por um plano de saúde para ter um mínimo de conforto
quando viesse a adoecer e no entanto, fiquei na ala das enfermarias até receber
alta. Só que observei e escutei quando as enfermeiras se referiam a uma paciente,
em especial, que estava internada sozinha num dos quartos de enfermaria, que
deveria ser ocupado por 4 ou mais pacientes. Ocorre que, a fulana era
riquíssima e o papai exigira isolamento total, então como, realmente, todos os
apartamentos estavam lotados, separaram uma enfermaria, exclusivamente para
aquela paciente. Como eu já estava raciocinando, lembro-me que fiquei indignada
com a situação. Aqui abro um parêntese: pensem numa classe de profissionais que
não parecem saber o significado da palavra ética, são as enfermeiras, pois
falam pelos “cotovelos” e nem se “tocam” que os pacientes, muitos deles
raciocinam. Mas deixa para lá; na hora pensei: ”Assim que sair daqui, abrirei
um processo por danos morais contra o meu Plano de Saúde, depois considerei
isso irrelevante, o mais importante era sair daquele lugar!
Uso óculos,
ou às vezes lentes de contato e nos primeiros dias, não sei o porquê fiquei sem
óculos; talvez não tenham me dado, porque havia o risco de eu quebra-los e
também, provavelmente me cortar; estou apenas supondo. É triste ficar vendo
vultos e pior, por não conhecer o ambiente físico sair “batendo” nos móveis,
nas coisas (tenho 7 graus de miopia): tudo era muito estranho para mim. Comer
era um dos piores momentos. Detesto leite e era obrigada a “ingeri-lo” goela
abaixo, pois quando tentei explicar para uma das enfermeiras, que não gostava
de leite, ela bruscamente, abriu a minha boca, pegou a xícara e despejou aquele
líquido horrível na minha boca, quase vomito. Minha roupa ficou toda suja,
nojenta, molhada de leite. Não chorei! Olhei para ela e pensei: “Meu Deus! O
que estou fazendo aqui!?” Naquele
instante, eu percebi, que jamais minha vida seria a mesma, porque a sociedade é
muito cruel, e daquele momento em diante, eu seria simplesmente mais uma
maluca, maluquinha, doidinha como dissera dias depois, um dos meus cunhados.
Qual a lição
que tirei disso: não importa o que disserem, um dia, eu vou sair dessa
situação. Confio no meu Deus e tenho absoluta certeza, que há um objetivo para
tudo isso. O meu Deus, não iria me deixar viver uma situação tão caótica, se
não tivesse um objetivo maior para a minha vida e foi, esse pensamento que
fixei em minha mente, pois sabia que somente o meu Deus me curaria, pois os
médicos só fazem o que Ele determina, portanto senhores psicólogos,
psicanalista e psiquiatras, vocês não são deuses; são apenas instrumentos,
meios usados por Deus, e ciente disso, é que permito que me orientem, pois ao
invés de pôr minha vida em suas mãos, a ponho nas mãos do meu Deus, meu Senhor
e Salvador. Fiquem certos, só permito que me tratem, porque tenho consciência
que Deus dar ao homem inteligência para cuidar dos outros, de acordo com as
suas aptidões.
Maria da Luz de Lima Santos (paciente depressiva bipolar,
professora de língua e literatura portuguesa e brasileira, técnica de
engenharia – curso Saneamento Básico – funcionária empresa mista- CAERN/RN/Brasil
licenciada e funcionária pública estadual aposentada).
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