Vinicius de Morais: uma autobiografia em forma de entrevista.
OBS:
Complemento para aulas sobre poesia (literatura)
Fonte: www.geocities.com/paris/concorde,
por Clarice Lispector.
Nota:
transcrevemos algumas perguntas, se o leitor quiser mais, acesse a fonte
informada.
Tema:
Mulher, Poesia, Música.
Introdução:
Marcos Vinícius de Melo Morais (cronista, teatrólogo e poeta). Nasceu no Rio de
Janeiro, compôs as obras “Cinco Elegias”, “Pátria Minha”, “poemas, sonetos e
baladas”. Considerado como “memorável gênio da literatura” (fonte: www.pontenova.com.br/alepon/dorotea.html)
Clarice
Lispector (CL): Vinícius, você amou realmente alguém na vida?
Vinícius de
Morais (VM): Que eu amo o amor é verdade. Mas por esse amor eu compreendo a
soma de todos os amores, ou seja, o amor de homem para a mulher, de mulher para
homem, o amor de mulher por mulher, o amor de homem para homem e o amor de ser
humano pela comunidade de seus semelhantes. Eu amo esse amor mas isso não quer
dizer que eu não tenha amado as mulheres
que tive. Tenho a impressão que, àquelas que amei realmente, me dei todo.
CL: ...Duas
pessoas nunca são permanentemente iguais e isso pode criar no mesmo par novos
amores.
VM: É claro,
mas ainda acho que o amor que constrói para a eternidade é o amor paixão, o
mais precário, o mais perigoso, certamente o mais doloroso. Esse amor é o único
que tem a dimensão do infinito.
CL: Você já
amou desse modo?
VM: Eu só
tenho amado desse modo.
CL: Você
acaba um caso porque encontra outra mulher ou porque se cansa da primeira?
VM: Na minha
vida tem sido como se uma mulher me depositasse nos braços de outra. Isso
talvez porque esse amor paixão pela sua própria intensidade não tem condições de
sobreviver.
Isso acho
que está expresso com felicidade no dístico final do meu soneto “Fidelidade”: “que
não seja imortal posto que é chama/masque seja infinito enquanto dure”.
CL: Você suportaria
ser ídolo?
VM: Eu não
suportaria. Às vezes fico mal-humorado. Mas uma dessas moças explicou: é que
você, Vinícius, vive nas estantes dos nossos livros, nas canções que todo mundo
canta, na televisão. Você vive conosco, em nossa casa.
CL: Fale-me
sobre sua música.
VM: Não falo
de mim como músico, mas como poeta. Não separo a poesia que está nos livros da
que está nas canções.
CL: Você já
se sentiu sozinho na vida? Já sentiu algum desamparo?
VM: Acho que
sou um homem bastante sozinho. Ou pelo menos eu tenho um sentimento muito agudo
da solidão.
CL: Isso
explicaria o fato de você amar tanto, Vinícius?
VM: O fato
de querer me comunicar tanto.
CL: Você
sabe que admiro muito seus poemas, e, mais do que gostar ,eu os amo. O que é a
poesia para você?
VM: Não sei,
eu nunca escrevo poemas abstratos, talvez seja o modo de tornar a realidade
mágica aos meus próprios olhos. De envolvê-la com esse tecido que dá uma
dimensão mais profunda e consequentemente mais bela.
CL: Reflita
um pouco e me diga qual é a coisa mais importante do mundo, Vinícius?
VM: Para mim
é a mulher, certamente.
CL: Você
quer falar sobre a sua música? Estou esperando.
VM: Dizem,
na minha família, que eu cantei antes de falar. E havia uma cançãozinha que eu
repetia e que tinha um leve tema de sons. Fui criado no mundo da música, minha
mãe e minha avó tocavam piano, eu me lembro de como me machucavam aquelas
valsas antigas. Meu pai também tocava violão, cresci ouvindo música. Depois a
poesia fez o resto...
É curioso, a
alegria não é um sentimento nem uma atmosfera de vida nada criadora. Eu só sei
criar na dor e na tristeza, mesmo que as coisas que resultem sejam alegres. Não
me considero uma pessoa negativa, quer dizer, eu não deprimo o ser humano. É
por isso que acho que estou vivendo num momento de equilíbrio infecundo do qual
estou tentando me libertar. O paradigma máximo para mim seria: a calma no seio
da paixão. Mas realmente não sei se é um ideal humanamente atingível.
CL: Como é que
você se deu dentro da vida diplomática, você que é o antiformal por excelência?
VM: Acontece
que detesto tudo o que oprime o homem, inclusive a gravata. Ora, é notório que
o diplomata é um homem que usa gravata. Dentro da diplomacia fiz bons amigos
até hoje. Depois houve outro fato: as raízes e o sangue falaram mais alto. Acho
muito difícil um homem que não volta ao seu quintal, para chegar ou pelo menos
aproximar-se do conhecimento de si mesmo.
CL: Como
pessoa, Vinícius, o que é que desejaria alcançar?
VM: Eu
desejaria alcançar outra coisa. Isso de calma no seio da paixão. Mas desejaria
alcançar uma tal capacidade de amar que me pudesse fazer útil aos meus
semelhantes.
CL; Você
poderia me dizer quais as maiores emoções que já teve?
VM: Minhas
maiores emoções foram ligadas ao amor. O nascimento de filhos, as primeiras
posses e os últimos adeuses. Mesmo tendo duas experiências de quase morte –
desastre de avião e de carro - mesmo essa experiência de quase morte nem de
longe se aproximou dessas emoções de que falei.
CL: Você se
sente feliz?
VM: Se a
felicidade existe, eu sou feliz enquanto me queimo e quando a pessoa se queima
não é feliz. A própria felicidade é dolorosa.
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